domingo, 15 de janeiro de 2012

DEVERES, SONHOS E PAIXÕES - Capitulo 8

Capitulo 8

Rafaela estava se divertindo como nunca. Sentia um enorme prazer em flertar com Danilo, ele era completamente diferente dos homens daquele lugar. Bonito, elegante e incrivelmente sexy. Ela sabia, e ele também que acabariam na cama, mas não tinham pressa. Estavam curtindo aquele jogo de sedução. No momento em que Dominic escancarou a porta do pub, algumas cabeças se voltaram para ele, uma delas a de Julia. Embora tentasse ocultar não passou desapercebido de Laura o conflito de emoções que agitou sua jovem amiga. Ela ficou ainda mais curiosa quando viu as reações se reproduzirem no rosto daquele belo homem de cabelos cor de cobre no momento em que seus maravilhosos olhos acinzentados cruzaram com os de Julia para o rápido cumprimento. O que estava acontecendo ali? Que energia era aquela que Laura percebera fluir entre aqueles dois? Aquela troca de olhares ao mesmo tempo ansiosos e furiosos? E a forma como ele a conduziu pelo salão, quando sorrateiramente trocou os pares com Danilo durante a dança? Havia intimidade na forma como ele envolveu-a pela cintura e ela correspondeu enlaçando-lhe o pescoço, uma intimidade que só era possível entre amantes. Mas havia também uma fúria contida no olhar de Julia quando se dirigia a ele. Em Dominic a presença daquela mulher provocava reações inesperadas, ela o atraía, mas também despertava os seus instintos mais primitivos, era como uma égua selvagem a quem ele teria um enorme prazer em domar. Laura estava achando tudo aquilo muito divertido. Era por isto que gostava da companhia dos mais jovens, eles eram tão cheios de vida, arrojados, não tinham medo de arriscar, mesmo sabendo que corriam o risco de perder tudo. Ela estava curiosa para descobrir o que iria acontecer com aqueles quatro encantadores jovens a sua frente. Com Danilo e Rafaela era fácil saber. Eles eram iguais, cínicos, sedutores e absolutamente irresistíveis, a graça estava em adivinhar quem iria dar o bote primeiro, pois era certo que eles acabariam dormindo juntos, e depois... O mais provável seria que eles se afastassem assim como haviam se aproximado com um divertido flerte e nada mais. Mas Julia e Dominic havia algo diferente entre eles... Um cheiro estranho no ar... Uma certa magia... Eles pareciam atraídos para o centro de um furacão, mas a todo o momento a fúria daquele sentimento os repelia para longe, um contra o outro. Ainda assim, em diferentes momentos daquela noite, Laura flagrou-os, quando acreditavam que ninguém os via, encantados em admirar o 'inimigo'. Quando Dominic ao despedir-se deles, convidou-a para uma cavalgada na manhã seguinte, a velha senhora não hesitou. Era algo de que ela gostava muito, e depois da morte de Vicenso quase nunca cavalgara, e também porque lhe permitiria travar encontro a sós com Dominic, e quem sabe entender um pouco melhor o que havia entre ele e Julia.


***

Ela ficou dando voltas com toda aquela conversa mole tentando atraí-lo diretamente para a sua armadilha, mas aquele descendente de irlandeses era esperto. Então, com a curiosidade revirando suas entranhas ela resolveu ir direto ao ponto. Tinha o direito, Julia era sua amiga, mais que amiga, era sua menina e ela só queria vê-la feliz. E alguma coisa dentro dela lhe dizia que a felicidade de Julia passava por este homem, de uma forma ou de outra...
-O que há entre vocês?
Ele não pareceu surpreso, ao contrário, a postura relaxada que Dominic manteve em cima da égua, sem mesmo se virar para olhar sua interlocutora demonstrava isto. Refletiu por alguns minutos e respondeu também de forma direta, como fora questionado.
-Nada. Nós apenas dormimos juntos duas vezes, e só.
A resposta seca não deixou dúvidas, o assunto estava encerrado. Pelo menos por este momento. Laura ponderou se havia exagerado, não era da sua conta. Agira como uma intrusa, de uma forma que sempre criticava, só agora percebia. Eles permaneceram calados pelo resto do caminho e durante todo o tempo enquanto voltavam para o estábulo. Quando desmontaram, Laura fez questão de levar o seu cavalo para o banho. Enquanto os animais recebiam a recompensa pelo trabalho, Dominic se abriu, lentamente, devagar.
-Ela mexe comigo. De uma maneira que eu desconheço. Faz-me perder a cabeça.
Laura permaneceu calada e atenta, este era o seu melhor papel. Espelho, auter-ego. Ele não queria respostas, apenas precisava formular em voz alta as questões que o atormentavam.
-Faço e digo coisas absurdas perto dela, me sinto confuso e frágil.

A velha senhora silenciou e demonstrou com um assentimento de cabeça que estava ali para escuta-lo, que ele poderia confiar nela e utiliza-la como um confessor. O jovem irlandês relutou, remoeu, mas finalmente se abriu. Qual a comporta de uma barragem ao ser liberada, ele desaguou todos os seus sentimentos. Abriu seu coração e esparramou toda a angustia que o dominava. Quando ele queria recuar e ruminar, se escondendo na sua dor e confusao, Laura o instigava. Cutucava, perguntava, colocando o dedo na ferida e provocando-o a examinar seu coração na tentativa de entender o que estava acontecendo entre ele e Julia. E quando ela percebeu que tinha alcançado seu objetivo de deixa-lo com muito material para remoer como um bom irlandês, ela parou de instiga-lo. Sabia que havia cumprido sua função ali, agora seria a hora de cutucar a outra porção deste par. Ao despedir-se de Dominic foi procurar Julia. Sabia que sua jovem amiga iria tentar se esquivar da conversa, sair pela tangente, mas Laura era persistente e não descansaria enquanto não fizesse Julia encarar de frente aquela situação. As amigas sentaram-se a aconchegante mesa da cozinha para tomar café, e Laura foi implacável, não deu espaço ou tregua obrigando Julia a falar sobre o relacionamento com Dominic. No inicio a jovem médica se comportou exatamente como o teimoso irlandes, reduzindo toda a história a uma simples sessão de sexo selvagem. Mas Laura sabia que havia algo muito mais profundo entre aqueles dois, do que eles se permitiam admitir. E como um arqueologo, insistentemente cavando cada vez mais fundo nas entranhas dos sentimentos de Julia ela seguiu colocando o dedo na ferida, impelindo a sua menina a assumir os seus sentimentos e colocar pra fora tudo o que estava acontecendo entre eles. A atração entre aqueles dois era quase palpavel, tão densa que era possivel corta-la com uma lamina afiada, visivel para qualquer pessoa que estivesse proxima a eles, tão explosiva que Laura imaginava que alguem desavisado poderia se queimar, sair chamuscado caso se postasse na linha de tiro daqueles dois. Ainda que quisessem negar, era impossivel não notar como eles estavam atraídos um pelo outro. Laura não conhecia Dominic, não tão bem quanto conhecia Julia. Vibrara quando sua amiga se envolvera com seu neto acreditando que eles pudessem contruir uma vida juntos, e embora soubesse que eles haviam se gostado verdadeiramente no curto período em que foram namorados tinha plena consciencia de que nada, nem remotamente parecido com o que ela percebia ali entre Julia e aquele irlandês, ocorrera entre ela e Danilo. Recordava-se também do período em que Julia se envolvera com Rodrigo, sabia que eles se gostavam, pois quase se casaram, e Julia jamais assumiria um compromisso tão importante se não houvessem sentimentos muito fortes, porém mais uma vez sabia que não havia entre eles um sentimento com esta carga de paixão como ela observava existir ali. Não era possivel saber se havia amor, acreditava que nem os proprios atores tinham consciencia dos seus sentimentos naquela opereta, mas era algo mais profundo do que apenas uma rodada de sexo suado como aqueles dois teimavam em rotular o encontro. Laura tinha certeza de que havia um sentimento forte entre eles, poderia ser apenas fisico, e ainda assim ela acreditava que qualquer atração com a intensidade dos sentimentos que eles esperimentavam merecia uma chance de ser vivida, mesmo que se tornasse apenas um caso ardente com algumas semanas de duração. Se houvesse algo por baixo daquela intensa atração erótica que eles sentiam um pelo outro, com certeza explorar o desejo fisico seria o passo inicial para que os outros sentimentos viessem a tona. De qualquer forma Laura achava que valeria a pena investir em um relacionamento com Dominic, e encerrou a conversa dizendo claramente a Julia o que pensava. Sentiu-se satisfeita porque a amiga embora tivesse descartado sua opinião como algo irresponsável não fora muito convincente na negativa. Laura sabia que havia plantado a duvida na mente de Julia, e esperava que essa semente fosse fertilizada pelo desejo que ela sabia exisitir ali e acreditava também que estimulara suficientemente Dominic para que ele fizesse uma nova tentativa de aproximação. Fizera a sua parte, plantara as sementes, e esperava colher a felicidade para sua menina e para aquele irlandês que ela estava aprendendo a amar.

***

- Julia. Que bom encontrá-la, eu estava mesmo precisando ter uma conversinha com você, doutora. Ele fez questão de não esconder o sarcasmo na voz ao se dirigir a ela.
Julia estava parada quase na porta da sala do gerente, estática no meio do movimento para bater na porta e se anunciar que fora interrompido quando Dominic a abriu se preparando para deixar o banco. O gerente, que havia se levantado para se despedir de Dominic, permaneceu em pé atrás da sua mesa, observando atento a cena e tentando disfarçar a curiosidade que fora aguçada pelo tom de voz usado por Dominic e pela resposta gestual de Julia ao erguer o queixo em desafio.
- Vitor, você poderia nos emprestar a sala por alguns minutos?
Fingindo que estava a procura de algum documento o gerente demorou alguns segundos para responder
- Claro! Fiquem a vontade. Respondeu e dirigindo-se a Julia completou:
- Eu já verifiquei tudo, vou tomar um café e daqui a pouco nós discutimos os investimentos.
Julia respondeu com um movimento de cabeça e manteve-se impassível parada em frente a porta aberta da sala como se estivesse marcando posição em uma guerra. E enquanto ela sentia a ira começar a fervilhar dentro do seu peito, Dominic assumiu o comando das ações. Segurou-a pelo braço arrastando-a para dentro da sala ao mesmo tempo em que fechava a porta. Com um movimento que não permitia recusa ele obrigou-a a se sentar em uma poltrona situada em um dos cantos e falou:
- Sente-se, nos temos uma conversinha pendente.
Ela sentou-se no sofá ao lado de Dominic mantendo uma distância segura e bem definida entre eles. As costas retas, a postura impecável, o rosto sério. A raiva que borbulhava dentro do peito estava escondida sobre uma capa de gelo pelo controle férreo que Julia se empunha, não daria a ele a satisfação de perceber que estava irritada, e muito menos excitada. Incrível, incrível como ele sempre conseguia tira-la do sério.
- Você é muito petulante! Ela falou imprimindo um tom de desdém na voz para disfarçar a fúria que ameaçava dominá-la. Sua cabeça girava e o sangue martelava continuamente deixando a visão aguçada e brilhante, uma névoa vermelha se infiltrava nos cantos do seu campo de visão ameaçando explodir. Sujeitinho irritante... Irritantemente sexy...
Ele também estava bufando. Ela estava ali ao seu lado bancando a dama de gelo, com aquela postura ereta de rainha prestes a ordenar a decapitação de um traidor do trono, olhando-o por cima daquele narizinho arrebitado como se ele fosse um reles súdito que deveria se curvar a passagem da prima-dona. Mulherzinha irritante! Droga! E linda também!
- Petulante? Petulante? Eu sou petulante? Ele respondeu enfatizando com vigor o pronome possessivo.
Ela o encarou e empinou ainda mais o nariz fulminado-o com o olhar. Sexy! Deus ela era muito sexy!
- Vo-cê, vo-cê, me excluiu de uma reunião da qual participaram todos os profissionais da saúde de nossa cidade e eu sou petulante!
Ele estava furioso, vencendo a distancia que ela havia colocado entre eles, Dominic se aproximou de Julia enquanto falava espetando a ponta do dedo em seu ombro como se fosse uma lança ao mesmo tempo que pontuava a sua indignação. Ela escutou toda a enxurrada de reclamações que ele lhe lançava mantendo o rosto impassível até não poder mais se segurar. Afastou o dedo que ele espetara em seu ombro como se fosse uma mosca inconveniente e bufou ao reclamar entre os dentes.
- Rafaela, ela me paga! A raiva que ela estava sentindo fez com que o pensamento fosse praguejado em voz alta e não apenas mentalmente como ela desejara e ele ouviu.
- A Rafa não tem nada a ver com isto. Quem me contou foi o Vinicius que esteve na fazenda me ajudando com a vacinação e perguntou por que eu não havia aparecido no almoço e eu fiquei com cara de idiota sem saber do que ele falava.
Mais uma vez Julia empinou o queixo e novamente fez cara de desdém ao comentar ainda furiosa:
- Aaah! Linguarudo! Depois dizem que nós mulheres é que somos fofoqueiras.
Ele estava borbulhando. Ela não respondera a sua pergunta e ele queria saber. Iria cutucá-la até que ela lhe desse a resposta. Então voltou a carga.
- Posso saber, doutora, porque motivo eu, que tenho um diploma de veterinário, não fui convidado para a reunião? Ele havia se aproximado novamente e se sentou bem próximo de Julia. Próximo o suficiente para que ela pudesse ver que seus olhos acinzentados estavam escuros como chumbo, como o céu um pouco antes de uma das tempestades que costumavam assolar a cidade no verão.
- Será que a minha experiência na gestão de um dos maiores haras do país não seria útil ao seu projeto de ambulâncias, doutora. Ou o problema é o nosso envolvimento pessoal? Foi isso que a impediu de me convidar para participar da reunião? Ele jogou as últimas palavras na cara de Julia como se fossem farpas e continuou a encará-la com os olhos cor de fumaça fulminado-a com a sua raiva como se fossem relâmpagos e mantendo o maxilar cerrado numa demonstração clara de que ele estava no limite do seu controle.
Julia recuou o corpo alguns centímetros quase instintivamente quando ele lançou-lhe a pergunta e sentiu o ar ficar pesado dentro da sala, pois ele estava perigosamente próximo da verdade. Ela se debatera com a sua consciência durante vários dias até tomar a decisão de não convidá-lo. Dominic seria uma com certeza uma privilegiada cabeça pensante, seria uma idiotice não utilizar o conhecimento e a influência que ele tinha, mas estar próxima dele era quase uma tortura como ela mais uma vez estava constatando. Era como enfiar a mão dentro de uma caixa de marimbondos, perigoso! Muito perigoso! Impossível se manter neutra e impessoal com ele por perto. Sentir o cheiro dele era suficiente para fazê-la esquecer de tudo, até seu próprio nome. Nenhum outro homem jamais provocara este efeito em Julia, ele era capaz de derreter todos os seus ossos e deixá-la bamba apenas com um olhar. Ponderou que o melhor, ou o mais seguro, seria adiar a entrada dele no projeto por quanto tempo fosse possível. Por enquanto o projeto todo era apenas um sonho, um desejo, e era dela! E a reunião era apenas uma sondagem de terreno, uma forma de saber se a idéia era de alguma maneira viável. Se, e quando ele realmente se tornasse uma realidade a participação de Dominic seria necessária, a ajuda que ele poderia oferecer seria indispensável. Mas só quando isso acontecesse ela ira procurá-lo, não precisava que ele se intrometesse na história naquele momento. Não queria ter que lidar com a atração que sentia por ele. Tinha que se concentrar no seu trabalho e na construção da sua reputação como médica na cidade. Não tinha tempo para sessões de sexo selvagem num estábulo com um homem grosso e arrogante, por mais lindo e sexy que ele fosse.
Dominic manteve os olhos fixos nela exigindo uma resposta, e aquilo era irritante. Ela era fascinante. Mantinha aquela pose de rainha do gelo embora ele soubesse que ela estava fervendo por dentro. Ele achava aquele controle e aquele ar superior que ela sabia empregar com extrema competência uma qualidade muito excitante em uma mulher. Fazia com que ele desejasse descascar aquela finesse toda até tê-la ofegante e gemendo em seus braços como ele sabia que acontecia quando ela estava excitada. Nunca uma mulher conseguirá excitá-lo em tantos níveis como Julia. Não era apenas sexo, ela o estimulava em nível físico, emocional e intelectual. Tanto o seu corpo cheio de curvas deliciosas que ele agora conhecia intimamente, como a sua mente aguçada e inteligente e o seu coração generoso e apaixonado, tudo nela o atraía como nenhuma mulher antes o atraíra.
- Petulante! Petulante e arrogante, isso é o que você é! Primeiro, eu não lhe devo satisfações. Segundo, esse projeto é meu e, portanto eu convido quem eu quiser para participar. E terceiro, nós não temos nenhum relacionamento pessoal. Julia fez questão de pronunciar as últimas palavras de forma pausada e com bastante ênfase para que ele pudesse entender.
Sem perceber ela havia se aproximado de Dominic durante o seu discurso inflamado e os seus olhos azuis estavam escuros contrastando com a pele que ficara vermelha pela fúria que ela não conseguira conter. A postura fria e indiferente que ela tentara manter até aquele momento foi derrubada com a raiva que ele provocara ao escavar fundo e desnudar os sentimentos que ela tentava ocultava sobre uma camada de gelo. Mas ele percebera o fogo por baixo do gelo, o desejo por baixo da ira, e se regozijou com esta constatação, porque ele experimentava os mesmos sentimentos em relação a ela. Percebendo o que se passava sob a superfície de indiferença atrás da qual ela tentava se esconder Dominic se aproximou ainda mais de Julia fazendo com que seus joelhos se tocassem e obrigando-a a manter a posição para não denunciar o tremor que sentia ao tê-lo quase colado a si.
- Não é pessoal, Julia? Ele perguntou enquanto tomava o pulso dela e segurava-o entre os dedos para sentir a pulsação de Julia se acelerar com o seu toque.
Ela se manteve impassível, sem se afastar um milímetro sequer embora o seu pensamento fosse o de sair correndo dali, antes que não pudesse mais controlar o desejo de se jogar nos braços dele e esmagar a sua boca contra a de Dominic.
- Você acha mesmo que não é pessoal quando seu coração dispara só por estarmos próximos? Ele deslizou os dedos pelo pulso de Julia se deliciando em senti-lo se acelerar enquanto ele murmurava bem próximo a ela de forma sedutora.
- Você acha mesmo que não é pessoal, quando sua respiração fica ofegante no momento em que eu te abraço. Ele deixou a mão subir lentamente fazendo uma carícia por todo o braço de Julia até o ombro para depois descer novamente até o pulso que ele continuou a segurar entre os dedos.
- Não é pessoal quando você tremeu inteira de prazer em meus braços, nas duas vezes em que nós fizemos amor? Ele se aproximou mais ainda fazendo com que seus corpos estivessem tão próximos que ele pode ver a penugem dourada que cobria os braços e todo o corpo de Julia se arrepiar como se ela fosse uma gata no cio. O calor que saia dos corpos quase fundidos era tão intenso que podia ser sentido a quilômetros de distância e seria capaz de derreter um iceberg. Ele podia perceber também o pânico e o desejo estampados nos olhos azuis que o encaravam arregalados.
- Não é pessoal, Julia quando você fica com a garganta seca e sente a boca se encher de água ao pensar em me beijar. Ele passeou os olhos pela boca de Julia e sentiu o sabor da vitória ao flagrá-la engolindo em seco enquanto ele atiçava o fogo do desejo, como uma chama incandescente por todo o corpo dela.
Não havia mais nada em sua mente, ela não estava conseguindo pensar, toda a fúria se convertera em um desejo que ameaçava engoli-la como um lobo faminto e saltar para fora do seu corpo incitando-a a se entregar a ele. Ela estava prestes a se render, não havia escolha, o desejo que ele lhe despertava era quase implacável e ela estava começando a fraquejar em sua resolução de não se envolver com Dominic ao se lembrar do gosto da boca máscula se fundindo a sua e da sensação daquelas mãos percorrendo o seu corpo. Se ele mantivesse os olhos na boca dela e os corpos próximos mais um segundo ela iria ceder.
Dominic percebeu a rendição no fundo dos olhos azuis de Julia, e ponderou que ele poderia tê-la, mas não era mais o que ele queria. Não seria suficiente, não mais, apenas satisfazer o desejo físico e depois ouvi-la dizer que eles não poderiam ficar juntos. Era muito pouco, e ele não se contentaria com pouco. Queria mais, queria tudo, queria o coração e a mente de Julia junto com o seu lindo corpo e queria que ela aceitasse o que havia entre eles. Enquanto ela não o aceitasse não iria mais insistir. Ele já fizera isto uma vez, desejara e conquistara, mas da próxima vez que eles fizessem amor seria muito mais do que apenas físico, seria uma comunhão de corpo, mente e coração.
Ele estava agora muito próximo, com a boca pairando a milímetros da de Julia, quase tocando os lábios dela com os seus e foi preciso um controle quase sobre-humano para evitar saciar o desejo de saborear a boca macia de Julia e satisfazer o desejo que estava sentindo fluir entre eles.
- Sem ressentimentos, doutora. Eu estou a sua inteira disposição...
Ele executou o movimento de forma calculada, propositalmente para provocá-la, e Julia acreditou que ele fosse beijá-la, e se preparou pra isso entreabrindo os lábios na expectativa de sentir a boca quente e voraz de Dominic reivindicar e tomar posse da sua. E então ele desviou o rosto, roçando quase imperceptivelmente sobre os lábios dela e murmurou em seu ouvido com a voz sensual e quente:
- Para assuntos profissionais. E então se levantou exibindo o seu sorriso mais cínico e saiu deixando-a completamente atordoada.
Julia permaneceu imóvel. Toda cor desaparecera do seu rosto e ela sentiu uma náusea azeda revirando em suas entranhas. A ira que ela experimentava era tão poderosa quanto o desejo que ela sentira há alguns minutos e ainda reverberava fazendo seu sangue correr acelerado. Canalha! A consciência de que ela teria se entregado inteiramente e sem reservas a ele, se Dominic tentasse possuí-la fez com que o fel do ódio aumentasse e suplantasse o desejo que a inundara deixando-a fraca e atordoada. Ela segurava as bordas da poltrona com tanta força que os nós dos dedos estavam brancos. Porco chauvinista! Canalha! Arrogante! Ela desfilava mentalmente uma infinidade de palavrões tentando diminuir a fúria que a cobria como uma onda gigantesca. Pela primeira vez na vida ela teve vontade de quebrar alguma coisa. Qualquer coisa, só para ter a satisfação de se imaginar amassando aquele nariz arrogante. Mas é claro que ela não iria fazer aquilo, a Dra. Julia era uma mulher centrada e educada, não saia por ai atirando coisas e nem quebrando o nariz das outras pessoas, mesmo quando essa pessoa era um irlandês arrogante com complexo de grandeza.
Uma dor de cabeça insuportável começou a perfurar o seu crânio como se fosse uma imensa prensa, esmagando seus miolos e tornando qualquer pensamento uma tortura insuportável. Até mesmo respirar estava sendo doloroso. Não iria conseguir discutir investimentos, números, taxas de juros, rendimentos com aquela dor martelando-lhe o cérebro. Droga! O filho da puta conseguira estragar o seu dia. Sua vontade era ir pra casa, enfiar-se na cama e dormir por duzentos anos, mas a agenda do consultório estava cheia e ela não podia se dar ao luxo de desmarcar os pacientes. Era a primeira vez, desde que se instalara em definitivo, que elas conseguiam completar toda a agenda sem deixar nenhum buraco e ainda com três pedidos de consultas extras. Teria que dar um jeito de aliviar a dor de cabeça para poder atender aos pacientes. A melhor opção era desmarcar a reunião com o gerente do banco, tomar uma aspirina e se isolar por uma hora no consultório até recuperar o controle. E era melhor fazer logo isto para não atrasar muito o inicio do atendimento. E foi o que ela fez. Remarcou a reunião com Vitor, enfiou duas aspirinas na boca e mastigou-as no caminho para a clínica.
O consultório de Julia fora instalado em um sobrado do início do século situado no centro da cidade, próximo da praça principal e do banco. Era uma casa antiga e ampla de dois andares que Julia acabara por comprar em definitivo e reformara para se ajustar ao seu gosto e as suas necessidades. Na planta original o primeiro andar era composto pelo amplo hall, uma grande sala de estar, a pequena sala de música, dois banheiros, a copa, a cozinha, e o jardim interno. O segundo andar acomodava uma sala íntima, duas suítes, três quartos simples e dois banheiros.
Julia precisou reunir toda sua coragem para tomar a decisão de adquirir a propriedade em definitivo. O espaço era enorme, muito maior do que ela realmente precisaria para se instalar. Era um investimento de risco. Mas no instante em que entrou na casa pela primeira vez teve a certeza absoluta de que ela era sua. Enquanto o corretor a conduzia pelos diversos cômodos, desfilando a ladainha habitual dos vendedores, Julia ia mentalmente imaginando as transformações que iria implementar para realizar o seu sonho. Quando a visita terminou ela já sabia o que queria, e ela queria aquele sobrado. Depois da reforma a clínica tomou a forma que Julia sonhara, sem perder a beleza e imponência original.
A fachada foi completamente recuperada e Julia foi incansável em consultar fotografias e conversar com os moradores mais antigos para que a imponência do sobrado fosse restaurada como na época de sua construção. O resultado final foi uma harmoniosa fusão do antigo com o novo, a exuberância da fachada que remontava aos primórdios da cidade e no interior a tecnologia que permitia a médica exercer medicina de ponta mesmo estando no interior. Era uma combinação que se ajustava a personalidade da própria dona, Julia era uma elegante mistura de tradição e modernidade.
O primeiro andar fora completamente modificado, paredes foram derrubadas e o amplo hall se transformou em uma aconchegante recepção onde o jardim de inverno completamente revitalizado produzia um efeito sofisticado e aconchegante. Os dois banheiros foram mantidos, porque era prático e funcional. Toda a área que englobava sala de estar, sala de música, copa e cozinha foi transformada em dois consultórios e uma sala para pré-consulta, onde o paciente tinha sua pressão verificada, era pesado e o eletrocardiograma era realizado. O consultório menor estava sem uso no momento, Julia ainda não estava disposta a dividir seu espaço com outro profissional, o sentimento de posse que ela estava experimentando com a clínica era forte o bastante para que ela se recusasse a sublocar a sala. E a médica já havia decido que somente iria dividir o espaço se pudesse encontrar uma pessoa com quem se sentisse confortável e a vontade, do contrário continuaria em voo solo.
O consultório maior era usado por ela. A sala era ampla, e dividida de forma elegante em dois ambientes. A porta abria-se para um espaço amplo dominado pela mesa antiga, sobre a qual estava o computador, que Julia usava para receber os pacientes e iniciar a consulta. Uma parede de madeira, onde estavam pendurados os diversos diplomas de Julia, dividia a sala e delimitava a área de exame, onde os pacientes poderiam ser examinados com privacidade pela médica. Em um dos cantos da sala fora colocada uma escada em caracol que dava acesso ao segundo andar do sobrado. Este artifício permitia a médica uma alternativa discreta para um intervalo entre as consultas.
O segundo andar fora adaptado para suprir as necessidades de funcionamento da clínica. A escada em caracol saia diretamente dentro de uma das antigas suítes que fora transformada num quarto de repouso onde Julia poderia descansar, tirar um cochilo e até mesmo passar a noite na cidade se fosse necessário. Uma imensa cama de dossel, um aconchegante sofá, uma cômoda, um guarda-roupa, um microsistem e uma televisão ocupavam o espaço. Numa concessão hedonista ela mantivera no banheiro da suíte a antiga banheira com pés em garra, imaginando que em algumas noites poderia ser uma idéia relaxante utilizá-la ao final de um exaustivo dia de trabalho. O quarto ao lado da suíte foi transformado em uma biblioteca onde Julia organizou livros, revistas e todo o aparato necessário para manter-se atualizada na sua profissão.
A segunda suíte foi desmanchada e transformada na cozinha completamente equipada que fora transferida para o segundo andar, permitindo que se desfrutasse de uma refeição completa, um lanche ou um simples café. Neste piso, ao lado da cozinha, no antigo banheiro da suíte, fora construída uma despensa onde era guardado o material de escritório e o que mais fosse necessário para o bom funcionamento da clínica. Os outros dois quartos simples também foram transformados. Mais um consultório foi construído e uma sala de atendimento onde poderia ser feito curativo, aplicação de injeção ou mesmo algum paciente poderia ser mantido em repouso se fosse necessário.
Ainda lutando contra a insuportável dor de cabeça, Julia entrou no sobrado e sem dar espaço para perguntas e ordenou a Rafaela que segurasse o início do atendimento por uma hora. Sessenta minutos depois de fechar a porta da sua sala, e após tomar uma generosa xícara de café tirada da máquina de expresso que ela comprara para a cozinha que instalara na sua clínica, Julia estava se sentindo quase humana. Pegou o telefone e pediu a sua secretária que fizesse entrar o primeiro paciente do dia.

***

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