CAP. 15
ERAM QUASE CINCO HORAS DA MANHÃ QUANDO REBECA ACORDOU, AINDA ESTAVA ESCURO. ASSIM QUE ABRIU OS OLHOS PERCEBEU COMO SE SENTIA MAL. A DOR DE CABEÇA ERA INSUPORTÁVEL, NA BOCA AQUELE GOSTO AMARGO COMUM NA RESSACA, ESTAVA COM SEDE. QUANDO VIU A AMIGA DORMINDO AO SEU LADO, AINDA VESTIDA, AS LEMBRANÇAS COMEÇARAM A VOLTAR A SUA MENTE. EM FRAGMENTOS, CONFUSAS, SOMENTE UMA FRASE ERA CLARA:
“... ESTOU GRÁVIDA DO SEU MARIDO.’
AQUELE SENTIMENTO DE DESESPERO TORNOU A INUNDAR-LHE O CORAÇÃO, MAS ELA FORÇOU-SE A LEVANTAR. ENTROU EMBAIXO DO CHUVEIRO E DEIXOU A ÁGUA FRIA ENTRAR EM CONTATO COM O SEU CORPO, A SENSAÇÃO DE CERTA FORMA ALIVIOU A DOR DE CABEÇA, MAS ELA AINDA ERA MUITO FORTE. SAIU DO BANHEIRO, COLOCOU UMA CAMISETA DE MALHA LARGA E UM SHORT E FOI ATÉ A COZINHA TOMAR UM CAFÉ E ASPIRINA.
POUCO TEMPO DEPOIS AMANDA ACORDOU. AO PERCEBER QUE A AMIGA NÃO ESTAVA AO SEU LADO SE SOBRESSALTOU.
‘-REBECA. TUDO BEM?’ GRITOU APAVORADA.
‘-TUDO BEM, MAS, POR FAVOR, NÃO GRITE. EU ESTOU NUMA RESSACA FODIDA.’
AMANDA JUNTOU-SE A AMIGA NA COZINHA.
‘-QUER UM CAFÉ?’
‘-SIM.’ RESPONDEU AMANDA.
‘-EU NÃO ESTOU SENTINDO NENHUMA FOME, ALIÁS, ACHO QUE NÃO VOU CONSEGUIR COMER NADA HOJE. MAS VOCÊ DEVE ESTAR COM FOME, O QUE VAI QUERER?’
‘-REALMENTE ESTOU MORTA DE FOME. QUALQUER COISA SERVE, TORRADA, BISCOITO...’
‘-BOM, TENHO OS DOIS, O QUE VAI SER?’
‘-TORRADA.’
REBECA AJEITOU A MESA DE CAFÉ COLOCANDO TORRADAS, MANTEIGA E GELÉIA DIANTE DA AMIGA. O EFEITO DO ANALGÉSICO JÁ COMEÇAVA A SE FAZER SENTIR E A DOR ESTAVA ALIVIANDO.
‘-SERÁ QUE VOCE PODE ME CONTAR O QUE ACONTECEU? EU NUNCA VI VOCÊ BEBER TANTO? ACHO QUE VOCÊ MISTUROU TUDO?’
‘-EU NÃO FAÇO A MENOR IDEIA DO QUE, OU DO QUANTO BEBI, MAS PELA MINHA RESSACA NÃO DEVE TER SIDO POUCO.’
‘-QUANDO CHEGUEI AQUI VOCÊ ESTAVA COMPLETAMENTE BEBADA, E FALANDO COISAS SEM SENTIDO. ALGO COM O PAULO E UMA RESIDENTE LOURA...’
‘-NÃO ERAM COISAS SEM SENTIDO, ERA A VERDADE. A RESIDENTE DA CIRURGIA, A NOVA RESIDENTE.’ REBECA BEBEU MAIS UM GOLE DE CAFÉ E PROCUROU RESPIRAR FUNDO PARA CONTER AS LÁGRIMAS QUE AMEAÇAVAM VOLTAR.
‘-SEI, O QUE É QUE TEM?’
‘-ELE DORMIU COM ELA...’
‘-PORRA REBECA! DESCULPE-ME, MAS ISTO NÃO É NOVIDADE...’ AMANDA IMPRIMIU UM TOM ENERGICO A VOZ.
‘-NÃO, NÃO É. MAS ELA ESTÁ GRÁVIDA.’
REBECA FEZ UM ESFORÇO TREMENDO PARA SE CONTROLAR, MAS A SUA VOZ SAIU EMBARGADA E AS LÁGRIMAS COMEÇARAM A ROLAR EM SUA FACE. AMANDA FOI PEGA DE SURPRESA. A REVELAÇÃO CAIU-LHE COMO UMA BOMBA. ELA PRECISOU DE ALGUM TEMPO PARA ASSIMILAR A NOTICIA.
‘-GRÁVIDA?!’
‘-É. A VADIA TEVE A CORAGEM DE ME PROCURAR ONTEM E ME JOGAR NA CARA COM A MAIOR NATURALIDADE “...EU ESTOU GRÁVIDA DO SEU MARIDO.”’
‘-MAS... GRÁVIDA? COMO?’ AMANDA ESTAVA DESCONCERTADA, ERA MUITO PIOR DO QUE ELA PODIA IMAGINAR.
‘-VOCÊ TEM IDÉIA DO QUE ISTO SIGNIFICA?’ REBECA AGORA PERDERA TODA A TRANQUILIDADE E AS PALAVRAS SAIAM AOS BORBOTÕES DE SUA BOCA, INTERCALADAS PELOS SOLUÇOS. AMANDA ABRAÇOU-A E ESPEROU QUE ELA SE ACALMAÇE ANTES DE PERGUNTAR.
‘-FOI A RESIDENTE QUE TE CONTOU?’
‘-KARINA, O NOME DELA É KARINA. SIM, EU ESTAVA NA LANCHONETE TOMANDO UM CAFÉ ANTES DA AULA QUANDO ELA VEIO FALAR COMIGO.’
‘-E... VOCÊ CONVERSOU COM O PAULO... VOCÊ PELO MENOS CONVERSOU COM ELE...’
‘-CONVERSAR COM O PAULO? CONVERSAR O QUE? NÃO HÁ NADA PARA SER DITO, ELA JÁ ME DISSE TUDO...’
‘-COMO TUDO? VOCÊ NEM MESMO SABE SE ELA ESTA FALANDO A VERDADE? E SE ELA ESTIVER MENTINDO?’
‘-PORQUE ELA IRIA MENTIR? ELES JÁ TREPARAM, QUAL SERIA A VANTAGEM?’
‘-PELO AMOR DE DEUS, REBECA! ACORDA! ELA PODE ESTAR QUERENDO ACABAR COM O CASAMENTO DE VOCÊS, SERÁ QUE VOCÊ NÃO ENXERGA?’
‘-MAS TAMBEM PODE ESTAR FALANDO A VERDADE?’
‘-PODE, É CLARO QUE PODE. MAS E DAÍ? VOCÊ SÓ PODERÁ SABER SE CONVERSAR COM ELE. E, MESMO ASSIM, A RESPOSTA VERDADEIRA SÓ PODERÁ SER CONHECIDA QUANDO A CRIANÇA NASCER.’
‘-SABE O QUE ME MAGOA MAIS? NÃO É NEM O FATO DE QUE ELA POSSA ESTAR GRÁVIDA, O PAULO DETESTA CRIANÇAS, POR ISSO NÓS NUNCA TIVEMOS FILHOS. NEM MESMO O FATO DELES TEREM TRANSADO, O QUE ME MAGOA MAIS É SABER QUE ELE NÃO TEVE NENHUM CUIDADO. ELE NÃO PENSOU EM MIM EM NENHUM MOMENTO...’
‘-EU NÃO ESTOU ENTENDENDO?’ INTERVEIO AMANDA
‘-EU NÃO FALO DA TRAIÇÃO, DO FATO DE ELE ESTAR TRANSANDO COM AQUELA PUTA LOIRA, MAS ELE NÃO USOU CAMISINHA! SABE O QUE ISTO SIGNIFICA? O RISCO AO QUAL ELE ME EXPOS? ELE NEM MESMO PENSOU: “COITADINHA DA REBECA, TÃO BOBINHA, EU AQUI TREPANDO COM TODAS E ELA COMPLETAMENTE APAIXONADA POR MIM. PELO MENOS EU VOU USAR PRESERVATIVO, PARA EVITAR PEGAR ALGUMA DOENÇA...”, NÃO ELE ESTAVA POUCO SE LIXANDO...’
NOVAMENTE AS LÁGRIMAS ESCORRERAM PELA FACE DE REBECA, MAIS UMA VEZ AMANDA ABRAÇOU-A E DEIXOU QUE ELA CHORASSE EM SEU OMBRO.
‘-ENGRAÇADO, ONTEM QUANDO ELA ME DISSE: “... EU ESTOU GRÁVIDA DO SEU MARIDO.”, EU PERCEBI ALGO QUE NUNCA HAVIA PERCEBIDO ANTES. EU NÃO TENHO UM MARIDO! ELE NÃO É MEU MARIDO... ELE É MEU AMANTE. EU NÃO PASSO DE MAIS UMA DE SUAS VADIAS. SOU A PUTA OFICIAL, A PUTA TITULAR, MAS SOU APENAS MAIS UMA PUTA NA VIDA DELE...’
AMANDA OUVIA O DESABAFO DA AMIGA, EMBORA CONCORDASSE COM CADA PALAVRA DE REBECA TINHA SENSIBILIDADE SUFICIENTE PARA PERCEBER QUE NÃO ERA O MOMENTO DE EMITIR SUA OPINIÃO. SEU PAPEL ALI ERA SOMENTE OUVIR E DAR APOIO.
‘-EU NÃO TENHO NADA, NÓS NÃO TEMOS NADA. NÓS NEM MESMO MORAMOS JUNTOS. E ELE AINDA ME COLOCOU EM PERIGO! SABE LÁ QUANTAS VEZES ELE TREPOU COM ESTAS VADIAS SEM CAMISINHA? A GENTE QUASE SEMPRE USAVA, MAS ÀS VEZES ACONTECIA, ERA TÃO RÁPIDO QUE NEM DAVA TEMPO DE COLOCAR... ELE PODIA TER ME CONTAMINADO...’
AMANDA ESPEROU QUE REBECA SE ACALMASSE.
‘-ELE LIGOU, ONTEM.’
‘-CANALHA! É CLARO QUE AQUELA PUTA DEVE TER CONTADO A ELE.’
‘-EU NÃO SEI. ELE ME DISSE QUE CONVERSARIA COM VOCÊ HOJE.’
‘-NÓS TEMOS REALMENTE MUITO O QUE CONVERSAR.’
AMANDA OLHOU O RELOGIO E JÁ ERAM SEIS E TRINTA, SE SAÍSSE AGORA DARIA TEMPO DE PASSAR EM CASA E TOMAR UM BANHO ANTES DE IR TRABALHAR. REBECA PERCEBEU O MOVIMENTO SUTIL DA AMIGA E TAMBÉM CONSULTOU O RELÓGIO. A DOR DE CABEÇA VOLTOU A INCOMODÁ-LA.
‘-NOSSA, SE NÃO NOS APRESSARMOS VAMOS PERDER A HORA.’
‘-VOCÊ NÃO VAI AO HOSPITAL HOJE, NÉ?’
‘-UÉ, COMO NÃO? FAZER O QUE?’
‘-DE JEITO ALGUM! VOCÊ ESTÁ PÉSSIMA, NÃO VAI MESMO. PODE DEIXAR, EU LIGO E AJEITO AS COISAS.’
AMANDA FEZ COMO PROMETIDO. LIGOU PARA O HOSPITAL E COMUNICOU QUE A DRA. REBECA ESTAVA DOENTE E QUE HOJE NÃO IRIA AO HOSPITAL. PEDIU PARA CANCELAR OS COMPROMISSOS E DESLIGOU.
‘-PRONTO, TUDO CERTO.’
‘-OBRIGADA, AMIGA.’
‘-BOM, EU TENHO QUE IR. ASSIM DÁ TEMPO DE PASSAR EM CASA ANTES DE COMEÇAR O DIA. VOCE VAI FICAR BEM?’
‘-CLARO!, PODE IR. EU PRECISO MESMO FICAR SOZINHA, TENHO MUITA COISA PRA PENSAR.’
‘-VOCÊ QUER QUE EU VENHA A NOITE?’
‘-OH!, NÃO! DE FORMA ALGUMA. EU JÁ ESTRAGUEI A SUA NOITE ONTEM, VOCÊS IRIAM SAIR NÃO É MESMO?’
‘-É... SIM... MAS, TUDO BEM. EU FALEI COM O GUSTAVO E ELE ENTENDEU.’
‘-ELE É MARAVILHOSO. VOCÊ TIROU A SORTE GRANDE, AMIGA. NÃO O DEIXE ESCAPAR, TÁ?’
‘-HUM, PRONTO, JÁ VEM VOCÊ.’
‘-É VERDADE.’
‘-VOCÊ NÃO QUER MESMO QUE EU VENHA? NÃO TEM PROBLEMA, SE PRECISAR...’
‘-NÃO. EU VOU MARCAR COM O PAULO, NÓS TEMOS MUITA COISA PARA CONVERSAR HOJE.’
‘-ENTÃO TÁ. MAS, SE PRECISAR NÃO DEIXE DE ME LIGAR. BEIJOS.’
‘-OBRIGADO NOVAMENTE, E AH! AGRADEÇA AO GUSTAVO TAMBÉM.’
‘-TÁ.’
REBECA PERMANECEU NA COZINHA ALGUM TEMPO. TOMOU OUTRA XÍCARA DE CAFÉ, A CABEÇA VOLTOU A DOER E ELA COMEÇOU A SENTIR FOME. COMEU UMA TORRADA COM UMA FINA CAMADA DE MATEIGA ENQUANTO ANALISAVA A SUA SITUAÇÃO.
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